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quarta-feira, 31 de dezembro de 2014

Quadratura do círculo



Quadratura do círculo


Quadratura do círculo
O problema da quadratura do círculo é um dos três problemas clássicos da Geometria grega; consiste em construir, usando apenas régua e compasso, um quadrado com a mesma área que a de um círculo dado.

RESOLUÇÃO DO PROBLEMA
Como aconteceu com os restantes dois problemas, demonstrou-se no século XIX que o problema da quadratura do círculo não tem solução. Essa demonstração foi obtida em várias fases. Em 1801, no seu livro Disquisitiones Arithmeticae, o matemático alemão Carl Friedrich Gauss afirmou que, dado um número natural ímpar n > 1, são condições equivalentes:
é possível construir um polígono regular com n lados usando apenas régua e compasso;
n pode ser escrito como produto de números primos distintos da forma 22k + 1 (os chamados «primos de Fermat», dos quais só se conhecem cinco: 3, 5, 17, 257 e 65537).
No entanto, Gauss apenas publicou a demonstração de que a segunda condição implica a primeira.
O primeiro matemático a publicar efectivamente uma demonstração da impossibilidade de se efectuarem determinadas construções geométricas apenas com régua e compasso foi o francês Pierre Laurent Wantzel, em 1837.
Como é que se pode demonstrar que é impossível efectuar uma determinada construção com régua e compasso? É claro que para mostrar que uma certa construção é possível basta levá-la efectivamente a cabo. O que Wantzel conseguiu provar, influenciado pelas ideias de Gauss, foi que se se conseguir, partindo de dois pontos A e B, construir um ponto C com régua e compasso, então o quociente q entre as distâncias de A a C e de A a B tem as seguintes propriedades:
o número q é solução de alguma equação polinomial com coeficientes inteiros não todos nulos (ou seja, é aquilo que se designa por um número algébrico);
se P(x) = 0 for uma equação polinomial de grau mínimo entre as equações polinomiais com coeficientes inteiros não todos nulos das quais q é uma solução, então o grau de P(x) é uma potência de 2.
Vejamos três exemplos:

Mova o ponto A ou o ponto B. As distâncias do ponto A aos pontos C, D e E mudam, mas os quocientes destas três distâncias pela distância de A a B são constantes.
Nesta figura
o ponto C é um dos dois pontos de intersecção da circunferência de centro A e que passa por B com a circunferência de centro B e que passa por A;
o ponto D é um dos pontos de intersecção desta última circunferência com a circunferência de centro C e que passa por A;
o ponto E é o ponto de intersecção do segmento BC com o segmento AE.
Então os pontos C, D e E foram construídos a partir de A e de B com régua e compasso e:
A distância de A a B é igual à distância de A a C. Logo, o quociente entre a distância de A a C e a distância de A a B é igual a 1 e 1 é solução da equação polinomial x − 1 = 0, a qual tem grau igual a 1 = 20.
O quociente entre a distância de A a D e a distância de A a B é igual a √3 e √3 é solução da equação polinomial x2 − 3 = 0. Além disso, não é solução de nenhuma equação polinomial de grau inferior a 2 com coeficientes inteiros não todos nulos, visto que √3 é um número irracional. Finalmente, observe-se que 2 = 21.
O quociente entre a distância de A a E e a distância de A a B é igual a ½√3 e ½√3 é solução da equação polinomial 4x2 − 3 = 0. Além disso, não é solução de nenhuma equação polinomial de grau inferior a 2 com coeficientes inteiros não todos nulos, novamente por ½√3 ser um número irracional. Mais uma vez, tem-se 2 = 21.
Não é difícil ver que se fosse possível resolver o problema da quadratura do círculo, então resultaria das observações de Gauss e de Wantzel que √π seria um número algébrico. De facto, se fosse possível, partindo de dois pontos A e B, construir um ponto C tal que o círculo de centro A que passa por B e um quadrado em que um dos lados fosse o segmento que une A a C tivessem a mesma área, então o quociente entre os comprimentos dos segmentos AC e AB seria um número algébrico. Mas, por outro lado, se r fosse a distância de A a B, então a área do círculo seria igual a πr2, pelo que o comprimento do segmento AC seria necessariamente igual a √πr e então o quociente entre os comprimentos dos segmentos AC e AB seria √π.
Embora não seja óbvio, afirmar que √π é algébrico equivale a afirmar que π é algébrico. Mas em 1882 o matemático alemãoFerdinand von Lindemann demonstrou que π é transcendente (ou seja, não é solução de nenhuma equação polinomial com coeficientes inteiros não todos nulos) pelo que é impossível efectuar a quadratura do círculo apenas com régua e compasso.
SERÁ REALMENTE IMPOSSÍVEL?
Foi dito acima que o problema da quadratura do círculo não tem solução, mas isto quer somente dizer que não é possivel construir, usando apenas régua e compasso, um quadrado com a mesma área que a de um círculo dado. Usando outras ferramentas, tal como a quadratriz de Hípias, é possível resolver o problema.
Considere-se agora a seguinte construção:

Quadratura do círculo usando instrumentos euclidianos. Desloque o ponto A ou o ponto B e verá que as áreas do círculo e do quadrado são sempre idênticas.

O segmento situado a meia altura do lado esquerdo corresponde à unidade de comprimento e pode ser modificado.
A maneira de se obter o quadrado a partir da circunferência de centro O e diâmetro AB é a seguinte:
Seja H o ponto médio de AO.
Seja T o ponto do segmento OB tal que o comprimento de TB seja um terço do de OB.
Seja Q um ponto da circunferência de modo que o segmento TQ seja perpendicular a AB.
Seja S um ponto da circunferência tal que o comprimento do segmento BS seja igual ao do segmento TQ.
Sejam M e N pontos do segmento AS tais que os segmentos OM e TN sejam paralelos ao segmento BS.
Seja K um ponto da circunferência tal que A seja equidistante de K e de M.
Seja L um ponto tal que o segmento AL seja tangente à circunferência e tenha comprimento igual ao de NM.
Seja C um ponto do segmento BK tal que B seja equidistante de C e de H.
Seja D o ponto do segmento BL tal que os segmentos CD e LK sejam paralelos.
Sejam P e R tais que os pontos B, D, P e R formem os vértices de um quadrado dos quais um dos lados seja o segmentoBD.
Como foi observado acima, não é possível fazer a quadratura do círculo apenas com régua e compasso. Sendo assim, relativamente à construção acima exibida há três possibilidades:
algum dos passos da construção não pode de facto ser feito com régua e compasso;
o autor desta página fez batota, ou seja, a construção está feita de modo que os números que surgem após «Área do círculo» e «Área do quadrado» sejam iguais, mesmo que as áreas sejam de facto diferentes;
as áreas são apenas aproximadamente iguais; só não nos apercebemos disso por o valor das áreas ser dado com poucas casas decimais à direita da vírgula.
Destas três possibilidades, é a terceira que está correcta. O autor da construção foi o matemático indiano Srinivasa Ramanujan, que a publicou por duas vezes em dois artigos distintos:
Squaring the circle, Journal of the Indian Mathematical Society V, 1913, p. 132.
Modular equations and approximations to π, Quarterly Journal of Mathematics XLV, 1914, pp. 350–372.
A construção baseia-se no facto de 355⁄113 ser uma excelente aproximação de π. De facto, 355⁄113 ≈ 3,14159292… eπ ≈ 3,14159263…
No segundo dos artigos acima mencionados, Ramanujan revela ter encontrado «por métodos empíricos» uma aproximação de πainda melhor que 355⁄113, nomeadamente a raiz quarta de 92 + 192⁄22; este número é aproximadamente 3,1415926527…, enquanto que π ≈ 3,1415926536… Ramanujan também fez uma quadratura aproximada do círculo usando este facto:

Outra quadratura aproximada do círculo usando instrumentos euclidianos. Desloque o ponto A ou o ponto B e verá que as áreas do círculo e do quadrado são sempre idênticas.

O segmento situado a meia altura do lado esquerdo corresponde à unidade de comprimento e pode ser modificado.
A maneira de se obter o quadrado a partir da circunferência de centro O e diâmetro AB é a seguinte:
Seja C um ponto da circunferência que seja equidistante de A e de B.
Seja T um ponto do segmento AO tal que a distância de A a T seja um terço da de A a O.
Sejam M e N pontos do segmento que une B a C de modo que as distâncias C a M e de M a N sejam ambas iguais à distância de A a T.
Desenha-se o segmento de recta que une A a M bem como o que une A a N e considera-se neste último o ponto P tal que a distância de A a P seja igual à distância de A a M.
Seja Q o ponto do segmento AM que faz com que os segmentos PQ e NM sejam paralelos.
Desenha-se o segmento de recta que une O a Q o considera-se no segmento AM o ponto R que faz com que os segmentosOQ e TR sejam paralelos.
Desenha-se o segmento de recta AS que é perpendicular a AB e tal que A seja equidistante de R e de S.
Considera-se um ponto U tal que a distância de O a U seja meio proporcional das distâncias de O a B e a S.
Então, como explica Ramanujan, a distância de O a U é uma excelente aproximação da sexta parte do comprimento da circunferência, ou seja, do comprimento do segmento OA multiplicado por π⁄3. Logo, o meio proporcional dos comprimentos dos segmentos OA e OU, multiplicado por √3, é uma excelente aproximação do comprimento de OA multiplicado por √π. O ponto V é precisamente obtido de modo que o comprimento do segmento OV seja igual ao meio proporcional dos comprimentos dos segmentos OA e OU, multiplicado por √3.
UM OUTRO TIPO DE QUADRATURA
Em 1925, o matemático polaco Alfred Tarski propôs o seguinte problema: É ou não possível dividir um círculo num número finito de partes que possam ser reordenadas de modo a formarem um quadrado? Este problema é totalmente distinto do problema clássico da quadratura do círculo ou de outros problemas clássicos, por dois motivos:
por um lado, é menos exigente do que o problema clássico da quadratura do círculo, pois não há qualquer restrição referente à forma das partes nas quais se divide o círculo e, em particular, não se exige que os bordos dessa partes só possam ser obtidos com régua e compasso;
por outro, é mais exigente do que outros problemas clássicos de decomposição de figuras geométricas, pois exige que não haja sobreposição nos bordos das partes.
O problema de Tarski revelou-se bastante difícil de resolver. A resposta (afirmativa) à questão só foi dada 65 anos mais tarde, pelo matemático húngaro Miklós Laczkovich.
Data da última actualização deste documento: 2012–05–06



http://www.fc.up.pt/mp/jcsantos/quadratura.html

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